Aikidô – Uma Reflexão

Walter Núñez Martínez

Todo instrutor de Aikidô deve ter passado, vez ou outra, pelo problema que é definir no que consiste o Aikidô. A complexidade do tema é imensa, uma vez que a ideia contida no Aikidô remonta a princípios filosóficos e religiosos. Morihei Ueshiba Sensei era um homem profundamente ligado à religião e via no Aikidô um meio de reconciliar todos os homens: “Aikidô é a arte da reconciliação. O homem que deseja brigar perde sua ligação com o Universo – e aquele que tenta dominar as pessoas termina dominado. Nós estamos aqui estudando a arte de resolver os conflitos e não de iniciá-los.” (MORIHEI UESHIBA, O-SENSEI, O FUNDADOR DO AIKIDÔ)
Quem se restringe a vislumbrar no Aikidô simplesmente uma arte marcial como tantas outras originárias do Oriente – e, em especial, do Japão – estará incorrendo num erro na visão de muitos mestres, pois a carga significativa do Aikidô (em Português: Caminho da Energia Harmonizada) vai muito além desse enfoque: “A arte marcial é só um subproduto do Aikidô e não é o mais importante.” (KEIZEN ONO SHIHAN)
Como definir Aikidô para um ocidental que desconheça a cultura japonesa? Isso seria impossível, pois essa arte é fruto dessa cultura e só pode ser explicada dentro desse contexto cultural. A procura oriental do verdadeiro caminho do Budô recai na compreensão ampla do ser humano e do Universo. Não podemos ser perfeitos se buscamos a destruição do outro, por ser também ele parte da Natureza. Daí a necessidade de um profundo conhecimento do outro e de si próprio, e de uma constante busca de integração com o Universo: “Aikidô é o poder da harmonia, de todos os seres, todas as coisas trabalhando juntas.” (KISHOMARU UESHIBA SENSEI)
Os movimentos circulares do Aikidô fazem com que nos sintamos parte desse Universo, em que tudo coexiste num absurdo caos harmônico, movendo-se dentro de trajetórias circulares, desde os elétrons ao redor do núcleo do átomo, até os planetas ao redor das estrelas e estas dentro das galáxias: “Nossos corpos são compostos do pó das estrelas. Os mesmos átomos que constituem as estrelas formam nossos corpos. Nós somos filhos das estrelas, e as estrelas são nosso lar.” (CARL SAGAN)
Nunca uma filosofia de vida esteve tão próxima da Ciência! Apesar de sua origem bastante intuitiva, o Aikidô obteve um grau de importância inigualável no equilíbrio harmônico entre as coisas, as pessoas e as ações. A busca da excelência no Aikidô se confunde com a necessidade humana de buscar a perfeição, ainda que isso seja um ideal totalmente utópico: “Eu já sentia que alguma coisa dentro Aikidô estava além da técnica corporal. Então pesquisava e procurava por isso. Qualquer movimento da vida diária, sem querer, eu ligava com essa parte. Ainda hoje procuro e engatinho, para chegar ao caminho que O-Sensei ensinava e nos deixou.” (KEIZEN ONO SHIHAN)
Se limitarmos o Aikidô ao treinamento físico, teremos uma forma talvez repleta de beleza, porém sem o seu respaldo espiritual; é bastante lógico que alguém que busque somente o conjunto das técnicas do Aikidô não seja chamado de aikidoísta. O Aikidô resume em si o conjunto das técnicas, o ideal de harmonização entre os homens – e destes com a Natureza – e a busca de um estágio superior de desenvolvimento humano: “Isso é minha mensagem para todo aikidoísta: procurar o que a Humanidade precisa. Dentro do ensinamento do Aikidô, a verdade não é derrubar ou derrotar o parceiro, é construir a Humanidade. Isso é o fundamental do Aikidô, isso é o que devemos treinar e não esquecer.” (KEIZEN ONO SHIHAN)