O RELAXAMENTO NO AIKIDÔ
A complexidade do Aikidô nos coloca constantemente em situações difíceis quando somos indagados acerca de sua natureza. Defini-lo somente como “uma arte marcial” nos faz incorrer num erro grotesco, pois como se pode pensar em usar num confronto entre pessoas uma atividade de reconciliação entre os seres humanos? O Aikidô é uma postura de vida, uma busca de integração com o outro e com o Universo. A “arte marcial” propriamente dita é um mero subproduto do Aikidô, e não a sua principal finalidade.
Entretanto só vou focalizar os fundamentos técnicos marciais e o seu modo de aplicação, algo tantas vezes esquecido por analogia automática que os menos informados estabelecem com outras atividades marciais.
Desde o início de minha vivência no Aikidô, o que mais me foi cobrado foi o relaxamento corporal, principalmente nos ombros, sem a perda da firmeza nos movimentos, meta que confesso jamais haver alcançado completamente. Como atingir tal proeza?
Alguns acontecimentos me auxiliaram bastante nesse quesito; relatarei dois deles.
Há algum tempo, estando numa loja de materiais de limpeza, resolvi adquirir uma vassoura semelhante à que minha mãe possuía quando eu ainda era uma criança: uma vassoura comum, de palha, daquele tipo que nos faz recordar as vassouras em que as bruxas voavam nos desenhos animados. Pura nostalgia de minha parte. Jamais imaginei que tal utensílio doméstico me auxiliaria bastante numa reflexão filosófica sobre a movimentação no Aikidô. Passei a utilizar esse primitivo objeto de limpeza para varrer as folhas de árvores que caem constantemente no quintal de minha casa. E comecei a constatar que não necessitava de força física quase alguma para efetuar a varrição; quanto mais força aplicava, menos eficiência alcançava na limpeza. Para realizar um bom trabalho, é necessário que se empregue suavidade nos movimentos, tocando o chão levemente com os fios de palha, porém com firmeza e num certo ritmo, e com uma postura ereta das costas para que essa atividade não nos cause dor lombar ou cansaço demasiado. Continuo a praticar essa atividade diariamente, tornei-a praticamente a oração diária do meu corpo, o que me levou a compreender melhor (e na prática) o funcionamento das técnicas do Aikidô.
Por estranha coincidência (algo em que eu, pessoalmente, jamais acreditei), por essa mesma época, Ono Shihan começava a desenvolver suas técnicas pessoais de respiração que nos eram passadas e explicadas durante suas aulas. E nessas aulas, paralelamente ao relaxamento e à suavidade, nosso Mestre sempre destacou a importância de se colocar o corpo ereto e com o seu peso descarregado nas costas, no cóccix e nos calcanhares a fim de que conseguíssemos liberar nossa energia vital KI pelas palmas das mãos. Bingo! Estava resolvido o grande problema do relaxamento corporal!
Dessas minhas experiências pessoais, surgiram mudanças significativas nos meus movimentos na aplicação das técnicas do Aikidô: estas se tornaram mais naturais, mais elegantes e harmoniosas, e principalmente muito mais eficientes!
Espero que este breve relato sirva de incentivo e de subsídio aos que buscam a verdadeira harmonização na prática dessa apaixonante e maravilhosa arte.
WALTER NUÑEZ MARTINEZ
Godan em Aikidô
Discípulo de Keizen Ono Shihan